Enquanto a maioria de nós passa a vida tentando ajustar suas relações com seus respectivos pais e mães, muitos à nossa volta vivem a vida sofrendo a falta de não ter os seus.
Creio hoje que não há nada errado nas dificeis relações que vivenciamos com nossos pais. Faz parte da evolução de todos aprender um com o outro. Querendo ou não, somos muito mais os nossos próprios pais do que gostaríamos de ser. Carregamos não só as características físicas e genéticas, mas o comportamento, as qualidades e defeitos, sejam eles quais forem.
É bem provável que na infância tenhamos visto nossos pais como os melhores pais do mundo, verdadeiros heróis. E na rebeldia da juventude adolescente, eles tenham se tornado os nossos vilões. E só lá na frente, quando também nos tornamos pais, é que finalmente nos vimos neles. E vice-versa. Acontece então a maturidade da vida e a afinidade de sermos juntos quase que uma coisa só. Pertencemos tanto um ao outro que quase somos iguais.
Conscientemente ou não, passamos a vida tentando provar dezenas de coisas à nós mesmos. Não somos assim, ou não somos assado. Você está certo nisso e errado naquilo, e por aí vai. Mais do que uma necessidade de provar algo à alguém é a vontade de ser melhor ou diferente daquilo que incomoda a nós mesmos Até o momento em que finalmente aceitamos: somos parte disso e pronto. A resiliência nos acalma, num tempo que às vezes parece tarde.
E se para quase todas as pessoas no mundo a vida passa por isso, o que diremos daqueles que simplesmente não tiveram nada disso? Não tiveram seus pais para reclamar, para discutir os seus defeitos e julgar suas atitutes erradas? A filha que não teve a mãe para reclamar da roupa que não ganhou como queria, ou o filho que não pôde discutir bravamente com o pai suas opiniões contrárias?
Se passamos a vida regidos por um inconsciente que sempre nos leva ao encontro de nossos pais, como vivem os que não tem o seus?
Pior do que uma vida inteira brigando com pai ou com mãe, é nunca saber como teria sido. O vazio do pertencer à uma família que se torna incompleta ou simplesmente inexiste também afeta o nosso nível de inconsciência, nos levando a uma busca por uma compensação sem fim. O vazio e a carência é o que permanece. Busca-se então aquele amor ou ainda as brigas e desavenças em outros.
Até que se tome consciência desse conhecimento de forma racional e emocional, passamos a buscar o afeto e amor de pais em nossos cônjuges, filhos ou nos mais próximos de nós. É possível que as relações amorosas nunca dêem certo, uma vez que se tenta nessas relações a satisfação de algo que ali não cabe e nem faz parte. Acontecem relações seguidas, todas aparentemente falhas e doloridas, quando o erro está no que se busca e na expectativa inconsciente gerada sobre o outro.
Sei de pessoas que perderam seu pai ou sua mãe muito cedo. Percebo diferentes comportamentos. Os mais esclarecidos neste sentido tem mais habilidade para seguir em frente. Outros lamentam a perda quase que a vida inteira, emperrando a própria vida de ser algo melhor.
Há de se ter compaixão por quem já perdeu os seus, mas nada além disso. Muito mais providencial do que pena é o esclarecimento. Para nós mesmos, que possamos reconhecer os nossos como a nós mesmos mais cedo, e aos outros, para que sigam em frente mesmo sem os seus, mas no amor e caminho da vida.
De um jeito ou de outro, estamos todos aqui para aprender.