O que você faria, se no dia do enterro de sua mãe, encontrasse em suas mãos um bilhete inacabado para você com as seguintes palavras “Sinto muito o que aconteceu entre nós na semana passada, queria que soubesse que tenho saudades. Agora minha vida está por um fio, arrependo-me das brigas que causei, das quais não adianta mais falar, pois o passado não volta. Mas, sinto que preciso te dizer três coisas…”?
Este é o início da instigante história de Leonor, filha única de Dona Rosa. Uma mulher de quarenta e cinco anos que se vê sozinha e sem rumo com a partida de seu último laço familiar.
Se a psicologia estima que o luto dura de dois a três anos, com Leonor não foi diferente, mas além do luto, ela carrega o peso das palavras não escritas naquele bilhete. Afinal, o que sua mãe a queria dizer? Sinto muito? Obrigada? Um segredo de família? Ou três? O que não se sabe, a imaginação é capaz de criar e recriar mil vezes.
Acompanhamos a trajetória de Leonor, numa busca que começa com uma fuga dela mesma: uma viagem à Portugal, que com o decorrer da narrativa se mostra enigmática e reveladora.
O enfrentamento de Leonor acaba sendo muito mais do que a ausência de sua mãe, mas a ausência de si perante a vida. Por que Leonor tinha tanta dificuldade de realizar seu sonho em abrir um restaurante? Seria a desaprovação de Dona Rosa mediante seus dotes culinários? O que a travava de seguir adiante, senão ela mesma e as lembranças ruins?
O sobrado azul, herdado de sua avó, Dona Cecília, se torna o cenário principal da história de Leonor, junto com as memórias do chá de camomila que ambas tomavam em meio à conversas e cumplicidade amorosa.
A presença de personagens marcantes como Heitor, o antigo jardineiro e morador assíduo do sobrado, mantém não apenas as rosas vivas, mas todas as lembranças e os segredos mais bem guardados. Todos a espera de serem revelados no tempo certo, com a doçura de quem também cultiva amor e paciência.
– Demorou – diz Heitor.
– Em que sentido? Para retornar ao meu verdadeiro lar? – questiona Leonor.
– O tempo traz respostas.
– Isso quer dizer o que?
– Que a pressa não traz benefícios a ninguém. O caminho é um processo de aprendizado, aos poucos as atribulações se acomodam.
Além do sensível jardineiro, o médico Gustavo é parte importante desse caminho de luto. O amor antigo de Leonor, que mal resolvido no passado, retorna para uma nova tentativa de se manter vivo, ainda que com um muro de silêncio que se forma entre ele a personagem principal.
Rogério, filho de Heitor, também impacta a história de vida dessa mulher, que antes tão sozinha, agora se vê rodeada de figuras importantes, além de cinco bilhetes que não são bem o que parecem ser, mas muito mais.
O quanto uma vida pode se transformar com uma partida? Uma perda que marca não apenas o início de uma grande reviravolta, mas a busca de Leonor e do encontro com si mesma.
O sobrado azul é o cenário, enquanto as rosas, as próprias lembranças, ingrediente, tempero, amor e presença viva de quem se foi, os pontos que marcam a história de Leonor, como as placas numa estrada, indicando os pontos de virada e decisão.
Irá Leonor descobrir o que sua mãe a queria dizer? Ou cairá em esquecimento e dúvida que a acompanhará para o resto de seus dias?
“As rosas do sobrado azul” mexe com todos os sentidos, a cada capítulo, com o cheiro e o sabor das rosas, a textura e as cores de cada detalhe, como o azul turquesa do sobrado e a lembrança que cada sentido é capaz de despertar.
Leonor nos convida a acompanhar a sua história, de forma a nos conectarmos com a espiritualidade e sensibilidade da vida, nos mínimos detalhes que nos marcam e nos fortalecem para sempre.
A autora, Zeli Scheibel, minha querida e preciosa amiga.
www.zelischeibel-escritora.com.br
1 Comment
E uma história, linda que fala das perdas da vida, dos arrependimentos, e da busca de sentido para a vida.