“A gente não precisa de certezas estáticas. A gente precisa é aprender a manha de saber se reinventar. De se tornar manhã novíssima depois de cada longa noite escura. A gente precisa é saber criar espaço, não importa o tamanho dos apertos”,
Ana Jácomo.
Eu ainda era uma menina quando ouvia meu pai se lamentando profundamente com as duas mãos na cabeça:
– O ano de 1994 foi um dos piores anos da minha vida…
Eu achava estranho e me questionava, se algum dia na vida teria essa percepção sobre algum ano que iria viver. Mas eu não devia ter perguntado…
Anos depois, entendi na pele a angústia do meu pai. Se o ano de 1994 tinha sido para ele um ano de perdas econômicas e surpresas nada agradáveis, o de 2019 veio para mim com tantas decepções, que a perda foi de uma versão minha, que eu fiz questão de eliminar para sempre. Ao menos foi o que eu pensei naquela época e nos anos seguintes.
As mudanças foram tantas dali em diante, que me levaram a um caminho de introspeção e introversão, numa fuga em mim mesma, que me tornou cada vez mais voluntariamente solitária, me sentindo mais segura e amadurecendo de inúmeras formas. Passado algum tempo, meu pai se foi e entre uma coisa e outra, centenas de histórias que não cabem neste texto.
Em 2019 eu fui embora da cidade de São Paulo com a promessa de nunca mais voltar, assim como para tantas situações que tinha relacionado com a cidade. Agora, quatro anos depois, voltei para a capital e ainda estou conhecendo uma versão de mim mesma, com novas características. Aí a mudança de Mindset!
Eu havia me tornado tão certinha, fugindo das decepções, erros e frustrações, que na verdade tinha me tornado engessada, uma pessoa mais velha do que a minha idade e fechada para tantas pessoas e situações.
Há três dias em São Paulo, ontem vivenciei algo tão simples, mas que pareceu um marco em minha vida. Imagine que em plena Avenida das Nações Unidas, eu estava a caminho do cinema numa Harley Davidson, segurando firme a bolsa nos braços, para não ser roubada e ao mesmo tempo, sentindo o vento e a liberdade de uma nova forma no lugar que considerava um dos mais perigosos do país.
Eu adorei andar de moto em plena noite de São Paulo, ainda que correndo o risco de cair, ser assaltada ou sofrer um acidente qualquer. Naquele momento, entendi que para evitar erros e riscos, eu estava cometendo o crime de não me permitir viver.
Creio que na vida, visitamos o fundo do poço inúmeras vezes e de diferentes formas, que nos levam a nos reinventar o tempo todo. Porém, nessa eterna busca de equilíbrio, temos que rever aquilo que deixamos para trás e permitir um novo olhar sobre o que foi deixado. Nossas novas versões devem ter permissão para alguns resgates do que ficou para trás, principalmente naquilo que nos permite ser feliz.
Entre o muito e o pouco, o certo e o errado, o velho e o novo, que a gente saiba buscar o melhor equilíbrio do que podemos ser e viver.
A vida é curta demais para nos apegarmos aos anos que pareceram não terem dado certo. Porque até mesmo o que deu errado veio para nos ensinar e nos fortalecer de alguma forma.
No morde e assopra da vida, a liberdade de simplesmente viver. Seja numa moto na noite em São Paulo, dentro de casa em exílio ou em qualquer lugar!
Desejo a você e a mim mesma o prazer de sempre encontrar algo novo e melhor em todas as nossas versões!