A minha vida inteira sempre tive gatos. Gateira de nascença, lembro que em torno dos três anos de idade carreguei um sapo, achando que era um felino. E sim: eu me lembro bem disso. Após alguns anos peguei o hábito de levar para casa qualquer gato abandonado que encontrasse na rua. Como meu pai não gostava de muitos animais em casa, eu fazia isso escondido. Só deixava meu pai ver o animal, depois que o mesmo já estivesse acostumado com a casa. Meu pai pegava o gato e levava para bem longe, mas aí o bicho voltava depois de alguns dias.
A minha fama era tanta que muitas vezes os vizinhos deixavam gatos na porta de casa. Teve uma vez em que deixaram uma caixa enorme de papelão bem em cima do capacho. Quando eu abri, havia uma gata branca com cinco filhotes. É, as pessoas sabiam que eu cuidaria da gataiada.
Os anos passaram e eu nem sei dizer quantos gatos eu tive em toda a minha vida. E posso afirmar que nunca houve um com a personalidade igual a de outro.
Quando retornei ao Brasil depois de seis anos morando na Alemanha, a bagagem foi grande: Sacudo, Princesa e Neném. Depois de anos de convivência, eles tinham sido a minha maior válvula de escape para a solidão que enfrentara no país. Seis meses depois, o meu preferido, o Neném, morreu abocanhado pelo cachorro do vizinho. Minha tristeza foi tão profunda, que ganhei uma paralisia facial. E só depois de três semanas diárias de tratamento, o meu rosto voltou ao normal.
Me tornei mãe, fiz faculdade, mudei de cidade, mudei de país, voltei, e lá estavam eles sempre comigo: os gatos. Há pouco tempo durante uma visita de meu pai, ele me disse: “Carolina, quando você vai parar com essa história de ter gato? Olha quanto pêlo na sua casa…”. E eu pensei em silêncio: “faz quase quarenta anos que ele tenta me convencer a não ter gatos e ele ainda não percebeu que isso nunca vai mudar?”. O comentário do meu pai era para argumentar, que como vou me mudar em breve, eu poderia, na opinião dele, finalmente começar uma vida sem gatos. Mal sabe ele que pretendo arrumar um terceiro felino, assim que me mudar para o lugar maior.
Porém, pelo mesmo motivo, de mudança e correria atual, deixei meus dois gatos na casa de meus pais, enquanto não estabilizo o ritmo da minha nova vida. Acho que faz um mês que estou vivendo sem gatos na minha casa. E isto é tão inédito e estranho para mim, que é algo que eu sinto todos os dias quando eu chego em casa: ninguém para me receber, ninguém para pular no meu colo enquanto deito no sofá e ninguém para fazer um carinho. Faz falta o bicho de quatro patas.
Ontem quando mal entrei no espaço onde pratico Constelação Familiar Sistêmica, ouvi um gato miando como se estivesse me chamando. Voltei o corpo para trás e uma gata veio correndo até mim. Ela se jogou no chão à espera de carinho. Passei a mão em todo seu corpo por um bom tempo e depois a peguei no colo. O carinho foi tanto que logo veio alguém pra dizer que a gata era do local. Mas mais tarde a responsável pelo espaço avisa, que quem quisesse poderia levar a gata. Eu imediatamente respondi: “Eu levo!”.
À espera de uma nova visita de meu pai, eu pensei: “Ele vai me matar. Meus gatos já estão na casa dele, porque ainda não coloquei minha vida nos eixos e ele vai dar de cara com outro gato em casa…”.
Porém na hora de ir embora alguém veio me avisar que a gata tinha dono sim. E todos estavam chamando a tal de “Dengosa”. Carreguei a gata de novo, abracei, cheirei e me despedi. Me senti renovada com tanto carinho que recebi. E fui embora sem a gata.
Mas no caminho eu pensei: “É dada demais. Não é Dengosa. É Quenga….”.