Após quase três anos de trabalho consecutivo, eu finalmente desfrutava o meu segundo dia de férias. Parecia que trinta dias sem compromissos seriam tantos, que a ansiedade e energia habitual do trabalho me forçavam a pensar em como utilizar o tempo o máximo possível. Então repensei e me permiti deixar a eficiência e intensidade do dia-a-dia fora de meu descanso.
Tudo parecia estar no lugar. Meu apartamento estava tão limpo e organizado, que parecia ter uma beleza incomum. Meus textos e trabalho como escritora andavam como eu esperava: para frente. Meus pais estavam com saúde, bem como eu e meu filho. Estava tudo certo.
Meus últimos dias de trabalho haviam sido de tensão e ansiedade, algo que utilizo, para realizar o máximo de tarefas possíveis. Usando o que é negativo como combustível para o positivo. Até mesmo o ódio pode ser usado como força para se seguir adiante. A vida é assim. Há sabedoria no impulso da vida.
Depois de seis meses sem ver meu filho, ainda aguardo o dia da viagem para visitá-lo, e ele me informa que logo estará de volta. Diante de tudo que já havíamos vivido, senti um aperto no coração, uma onda de dúvidas e receios, que vieram de forma branda. Depois senti o sublime em minha vida. Nem mesmo as dores do passado me incomodavam mais. Nem mesmo a certeza de novas mudanças e possíveis desacertos eram capazes de me incomodar. Os pensamentos positivos eram naturalmente mais fortes.
Mas como tudo podia estar tão bom?
Após uma última e recente mudança, tudo havia se transformado. Parece mesmo que em cada recomeço um milagre se faz. Adepta a mudanças constantes em minha vida, a última havia realmente sido difícil. Humilhações fizeram parte do que havia passado recentemente. E agora chegava o reconhecimento.
Amigos distantes fazendo a diferença, atuando em minha vida de maneira significativa. Pessoas que nunca vi, que simplesmente me ajudam. Leitores presentes e cheios de amor e motivação. A felicidade e plenitude que chegam em pedacinhos todos os dias. O milagre do invisível. O que os olhos não veem, mas que impreterivelmente chega.
Por que tudo estava tão perfeito? Será que deveria temer essa tão estranha e gostosa calma?
Diante de tudo em seu lugar, ergui os braços para o céu e agradeci. Com um sorriso no rosto e uma comoção profunda, disse a mim mesma: tem que haver merecimento!
Parece que é a lei da vida: primeiro o sofrer. Aprende-se! Nos tornamos humildes diante do existir e do próprio sofrimento. Crescemos com as lições e nos tornamos gratos a elas. E só depois a colheita chega.
Pode ser que amanhã tudo ainda esteja em seu lugar. Tão perfeitamente, que meus olhos chequem a veracidade da perfeição. Como pode ser que não. Mas a melhor lição que aprendi nos últimos anos é a que caminha comigo de mãos dadas: resiliência.
Se amanhã tudo for perfeito, agradecerei mais uma vez. E se não for, agradecerei também.
Para tudo que se quer, tem que primeiro haver merecimento.
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