No início da pandemia adquiri um gato chamado Tchuco, que reuniu toda a família depois. Quase ao mesmo tempo, minha irmã também adquiriu um gato, que surpreendentemente se tornaram amigos, como se fossem primos e falassem, haja visto que conversam entre si, embora ninguém entenda as fofocas miadas.
Tempo depois, meu filho adotou um terceiro gato.
Agora, cada um em sua casa e na mesma cidade, eu visito intercaladamente a todos em função dos gatos. Mas será mesmo?
Além disso, meus pais costumam ficar com o Tchuco quase todas as noites. Pois é, o gato é bem mimado, gosta de rotina e pede para passear de carro todo fim de tarde, sem exceção. Um gato bem diferente, engraçado e tão carinhoso, que às vezes, parece uma quenga. Se esfrega nas pernas alheias e se joga no chão para ser acariciado em todo seu corpo cheio de pelos.
O interessante dessa história é perceber a união familiar que animais de estimação são capazes de criar, com sua simples existência.
Ontem foi mais uma noite dessas. Eu saí, enquanto o Tchuco ficou com meus pais. Quando fui buscá-lo, o gato estava deitado no chão em frente à lareira, fazendo companhia para ele, enquanto ambos se aqueciam e olhavam o fogo queimar as toras de madeira, que tilintavam de vez em quando.
Eu cheguei, me sentei e fiz o mesmo. Ficamos os três ali, a maior parte do tempo em silêncio, na presença de nós mesmos. Em que ou em quem meu pai pensava? A minha mãe, logo na outra sala, também emitia forte presença, num momento de plenitude.
Eu respirei fundo e olhei para o rosto de meu pai, envelhecido e feliz com o momento, o gato a seus pés e uma sensação de estar no momento certo, com as pessoas certas, ainda que em silêncio, mas naqueles raros instantes em que se vive no tempo presente.
De onde eu estava eu não podia enxergar minha mãe, mas a sentia, como se estivesse ao meu lado. Foram poucos minutos, mas daqueles em que se sente pleno, completo e eterno. Onde a vida faz todo sentido em um único momento.
Há sete meses, depois de mais de vinte anos, voltei a morar em minha cidade natal, pequena e provinciana. E retornei com a dúvida, se estaria fazendo a coisa certa. E com o tempo, só pude perceber que estar perto dos meus é o lugar mais aconchegante e seguro que existe, ainda que não literalmente, mas estou nos braços de meu pai, minha mãe, filho e irmãos.
Não somos o melhor modelo de família, mas estranhamente os gatos fazem parecer que somos. Penso que são como anjos, já que sem dizer uma única palavra, trazem harmonia, amor e um tipo de plenitude que não se explica, apenas se sente.
A noite na lareira, aquela cena, agora mora dentro de mim!
O fogo na lareira, o gato no chão, o rosto de meu pai, minha mãe e um silêncio que me preencheu a alma!