Eu o conheci em meados de 2015. Acabara de entrar na empresa e ele era um dos fornecedores da tal. Irritadíssima com um atendente, que já havia cometidos erros demais, para o meu nível de paciência da época, num belo dia, aquele senhor apareceu no meio da minha sala, do nada.
_ “Dona Ana, permita me apresentar… Eu vim aqui para lhe pedir desculpas. A senhora merece todo o meu respeito e o melhor serviço que pudermos oferecer para a senhora”.
No meio do furacão de “um dia daqueles”, eu confesso, que naquele momento, não tive a sensibilidade, para enxergar o nobre ser que estava em minha frente. E olha, que ele havia viajado de avião, apenas para me conhecer e efetuar o pedido de desculpas.
Não pensei muito sobre o assunto naquele momento. Fato é que os serviços melhoraram. E com o passar do tempo, a relação com o fornecedor e o senhor agente foram ficando cada vez mais estreitas. Ironia do destino, acabei me tornando responsável pelo referente setor, um ano depois.
Aquele gentleman não é simplesmente um agente de viagens. Devo dizer que assim ele iniciou sua bem-sucedida carreira, há cinquenta e dois anos atrás. Hoje, membro de conselho de reconhecida agência, parece estar numa fase da vida, em que não precisa se preocupar com o sucesso ou o dinheiro. Então, ele simplesmente faz o que gosta: serve as pessoas. Agrada a quem pode e tenta fazer amigos através de suas gentilezas e longos bate-papos.
Existe gente assim ainda neste mundo?
Existe!
O nobre agente tem histórias para contar, que até Deus duvida. Seus funcionários passam apuros com suas graças, como por exemplo, quando ele mesmo “informou” um segurança na entrada de uma empresa, que um dos seus funcionários estava portando uma arma (Mentira!). E o mesmo se divertiu horrores, enquanto o pobre foi revistado e tratado com desconfiança pelos vigilantes do local.
Recentemente, numa última visita, veio até mim, para se desculpar por não ter ido à um evento de sua própria empresa, sabendo que eu reclamei a sua ausência. Veio como sempre: de surpresa. Ele afirma para seu funcionário: “A Dona Ana é minha amiga! Não preciso avisar. ”. (E Dona Ana sou eu). Cheio de boas intenções, começa com um sorriso sincero, cheio de elogios e simpatia. Logo em seguida, soube que ele tentou subornar alguém para me comprar chocolates, devido a impossibilidade de ele mesmo entrar num local vizinho, reservado apenas para uma determinada empresa.
Num mundo e sociedade cheia de regras para nos proteger de tudo, pessoas como ele, tentam dar o seu jeitinho, quando se trata de fazer o bem. À primeira vista, o tal senhor pode ser mal interpretado. Por vezes, muito mal interpretado. Vez em quando, seus funcionários “correm” atrás dele, na tentativa de socorrê-lo, quando avança nas suas tentativas de se encaixar nesse mundo, aquém de suas nobres intenções.
Para mim, é inspiração. Um senhor que poderia se dar ao luxo de apenas descansar, mas abusa da sorte para agradar pessoas simples e desmerecedoras como eu.
Num mundo, onde pessoas bem mais jovens e menos importantes, não se dão ao trabalho de dizer “bom dia”, o agente de viagens, com frequência, já se deu o trabalho de dormir fora de sua casa e acordar de madrugada, para dar suporte aos seus clientes (amigos, segundo ele). E como sempre: de surpresa.
Eu acho que nunca havia conhecido alguém assim. Demorei um pouco para entender de fato sua essência. Sua nobreza de espírito é demasiada para este mundo.
Ele faz diferença através do que ele simplesmente é. Para contar todas as suas histórias seria necessário um livro. Para quem teve o privilégio de sua convivência, certamente recebeu bem mais do que chocolates.
O senhor agente de viagens é um exemplo de vida.