O que esperar no primeiro dia de trabalho? Num novo local e com várias pessoas novas? Como durante anos havia trabalhado como professora na Alemanha e no Brasil, já não sabia bem o que esperar recomeçando numa empresa. Tanta ansiedade me rendeu até um pesadelo dois dias antes do temido primeiro dia. Eu chegava ao trabalho e havia uma mulher loira, linda, de vestido e batom vermelhos trabalhando em meu lugar. Ela mais parecia uma atriz de Hollywood, e eu tentava em vão falar com o diretor da empresa sobre o que estava acontecendo. Foi um pesadelo terrível: eu perdia o emprego mesmo antes de começá-lo.
Logo que cheguei, fui recebida com um abraço e um sorriso largo do meu novo chefe, um senhor alemão que há mais de quarenta anos mora no Brasil. Ele já havia se demonstrado tão gentil durante as entrevistas que meu “Santo” desconfiou: “Será mesmo possível que ele seja tão doce?”, eu realmente me questionei. E felizmente a resposta era sim.
Chegar a esta empresa não foi só uma boa expectativa de trabalho, mas uma chance de rever conceitos que se formaram em minha mente nos últimos sete anos, desde que fui morar na Alemanha e passei a conviver diariamente com este povo tão diferente do brasileiro e tão distante do que eu mesma era.
Apesar de ter sido a minha vida inteira uma pessoa desprovida e contra qualquer tipo de preconceito, com o passar do tempo adquiri alguns conceitos negativos em relação ao povo alemão. Isso porque sofri com preconceito e solidão no país. Mesmo depois de ter voltado ao Brasil, ainda continuava com a dura impressão daquela nacionalidade.
Eu ainda não sei como será este trabalho nos próximos meses, mas confesso que já estou apaixonada por ele. Se de um lado os diretores alemães me dão a chance de anular ou ao menos melhorar velhos conceitos de que não gosto, do outro também vejo várias pessoas sorrindo por onde passo. Me encontro num lugar onde a gentileza e bom humor são presenças constantes.
Nunca estive num local de trabalho como este antes. Apesar da empresa, recentemente, ter se tornado uma multinacional, a mesma é de origem familiar e ainda se parece exatamente isto: uma grande família. A grande maioria dos funcionários são conhecidos de décadas e velhos amigos da “casa”, e os que são novos como eu, primeira contratada da multinacional, são tratados como um novo membro da família que acaba de chegar.
Após horas de reunião com gerentes e supervisores no primeiro dia de trabalho somado a um buque de flores de boas vindas, ainda tive a inesperada oportunidade de ouvir as mais deliciosas histórias da empresa num jantar regado a caipirinha e risadas tipicamente brasileiras: exageradas! Literalmente, quase chorei de rir com a história do mudo que até atende telefone na fábrica. E por mais incrível que pareça, a história é atual e verídica!
Numa época de transição, onde eu agora participo ativamente da transformação de uma empresa brasileira numa multinacional dirigida por alemães, pela primeira vez na vida eu vejo perfeita harmonia entre a minha cultura e aquela a qual antes eu enxergava com tanta dificuldade. Ainda que eu seja uma das poucas pessoas a perceber tão perfeita melodia.
Vejo a junção do melhor do carinho e bom humor brasileiro com a disciplina e organização alemãs.
Percebi que os alemães não mudaram; eles são os mesmos. Mas a vida me deu mais do que uma oportunidade única de trabalho; me presenteou com a possibilidade de um novo olhar!
Não posso dizer que vesti a camisa da empresa, pois em poucos dias sinto que já vesti muito mais do que isso. Desnudei minha mente de velhos conceitos, dando ao meu espírito um fardo bem mais leve: o de voltar atrás e ver que eu estava errada.
Esta empresa e estas pessoas não ganharam apenas mais um membro na grande família, mas um coração pra eles entregue, agradecido pelas novas sensações com uma alma agora vestida de leveza e positividade.
Felicidade por fazer parte de uma nova e admirável família. Calor humano sem igual.
Paz em quebrar conceitos. E prazer pela leveza que isso trás.
E a novata aqui nem sabia…
Agora eu vou indo… o mudo também quer conversar comigo!