Esta semana me deparei com um acontecimento muito engraçado, que me levou a diversas reflexões e acontecimentos do passado.
Meu chefe, mais de quarenta anos de idade, diretor geral de uma indústria no Brasil pertencente a uma multinacional, tirou da pasta de trabalho um maço de figurinhas da copa 2014. Eu automaticamente concluí que eram para seu filho, mas em comentário com outro gerente, ele soltou que as figurinhas eram dele. Eu ri. Achei graça de seu lado criança e mais ainda, admirei sua liberdade e respeito com o seu lado mais importante. Coisa que muitos deixam se perder na vida adulta.
Me lembrei de quando meu filho era criança e nada o fazia mais feliz do que comprar ou ganhar um maço de figurinhas. A paixão era tanta, que certa vez, ao perder um álbum do Pokemon, me senti obrigada a fazer cartazes e pregá-los em todos os prédios do condomínio em que morava. Dois dias se passaram e o álbum reapareceu. Todo surrado, mas fez a alegria do menino. Numa outra vez, quando fui em minha primeira viagem à Alemanha, me lembro de ter comprado o seu melhor presente no país: um álbum de figurinhas da Alemanha. Como ele não poderia comprar figurinhas no Brasil, tratei de gastar uma pequena fortuna para que o álbum pudesse ser completado de uma só vez. A caixa da loja me lançou um olhar de repreensão quando pedi cem euros em pacotes de figurinhas. Ela não tentou por nenhum momento disfarçar sua indignação pela minha compra, me tratou como se eu fosse louca. Mas a alegria do meu filho quando recebeu o presente valeu qualquer esforço. Aquilo se tornou um tesouro dentre seus pertences.
Histórias de figurinhas com o meu filho não faltam. Não sei quantos álbuns foram. Talvez dezenas. Mas o prazer de se colecionar é universal, vem de longa data, é histórico, filosófico e terapêutico.
Walter Benjamin, filósofo alemão nascido em 1892 e integrante da Escola de Frankfurt, também era colecionador nato. Avesso, já naquela época, à industrialização dos brinquedos, o filósofo defendia a ideia e importância da imaginação infantil. Benjamin, dentre várias coleções, tinha uma de brinquedos.
Creio que Walter Benjamin se remexeria na tumba se pudesse ver como se encontra o entretenimento infantil nos dias de hoje: tablets, celulares, videogames e toda sorte de tecnologia. Mas em meio a toda a modernidade do século XXI, permanece o hábito da coleção de figurinhas. E consequentemente, arrisco afirmar, a chance de tantos adultos permanecerem fiéis a seu lado mais puro e importante: o seu lado infantil.
Eu não tenho mais a minha coleção de papéis de carta. Me faz falta. Mas de outras formas alimento a criança que existe em mim. Porque no fundo, somos todos crianças brincando, obrigatoriamente, de ser adultos.
Felizes os colecionadores de figurinhas, que mais do que figurinhas, colecionam momentos para as crianças dentro de si mesmos.