Quando uma das colegas de classe citou a frase acima, eu tive mais um dos meus acessos de risos durante a aula do Professor Marciano. O mais engraçado não é o nome da pessoa relacionado à frase, mas o ser, literalmente de outro planeta, que pousou em nossa sala de aula. E eu já sabia que isso ia virar matéria.
Já há alguns meses na pós-graduação, tínhamos começado com um professor tão bom, que a maioria de nós já estava de acordo: não seríamos mais tão bem surpreendidos. Seria impossível haver outro professor tão bom. E não é que estávamos errados?
Não falo aqui de currículos de mestres e doutores, ou ainda de longas explanações de assuntos difíceis durante horas e horas de aulas, ministradas por professores esbanjando conhecimento e anos de estudo e esforço. Estávamos sendo apresentados a um ser humano com uma capacidade incrível de tocar o outro. O toque que vem em palavras, gestos, olhares e perguntas que nos tocam o fundo da alma. O toque que faz refletir e sentir.
Quatro horas de aula. À noite. Depois de um dia inteiro de trabalho. Não é tarefa simples manter uma sala cheia de pessoas já cansadas, então motivadas e atentas até às 23 horas. Mas o professor extraterreno não conseguiu apenas isso. Também atingiu a façanha de eu levar meu pai para a aula da noite seguinte. E uma das colegas de classe também tentou arrastar o marido para o evento. Sim! Evento! Aquilo não é apenas uma aula, mas um evento que se traduz em show e lição de vida. Quatro horas onde somos instigados a pensar e a sentir, fora do pensamento linear, aquele por anos e anos imposto por uma sociedade velha e hipócrita. É um convite a se enxergar fora da caixinha.
Em uma de suas histórias, o professor contou o caso de quando ajudou um de seus alunos a reformular seu currículo. O estudante tinha origem ucraniana e tinha o hábito de há anos ensinar a dança de seu país todos os sábados de manhã a outros descendentes, com o intuito de manter e propagar sua cultura no Brasil. Marciano automaticamente o fez incluir a informação no documento.
Tempo depois o aluno voltou frustrado, pois não havia passado em determinada entrevista e a selecionadora não havia visto com bons olhos o hábito cultural do rapaz. O professor indignado respondeu: “Se ela não teve a capacidade de ver o valor embutido nesta informação, a sorte foi sua de não ter sido contratado pela empresa”. E explicou: um jovem de 20 anos, que se levanta toda manhã de sábado, há anos, para ensinar meninos e meninas uma dança ucraniana, não mostra o talento de dançar de um jovem, mas a sua disciplina, cultura e objetividade de vida. Enquanto a maioria “bebeu, caiu, levantou” (como ele se refere aos beberrões de plantão) na sexta-feira á noite e está de ressaca no dia seguinte, este jovem faz diferente, mostrando a qualidade que tantas empresas precisam e procuram para crescer: comprometimento, disciplina, humanismo e tanto mais.
E para fechar, um de seus jargões básicos que quase nos mata de rir. “O que se diz pra uma pessoa dessas (se referindo à entrevistadora)?” “Morre!!!” Brincadeira que repete toda vez que o assunto trata de pessoas que se recusam a sair do seu lugar de hipocrisia, mesmice e ignorância.
A história é simples. E apesar de seu ponto de vista parecer bastante óbvio, infelizmente ainda vivemos numa sociedade que não sabe enxergar além do clássico, quadrado e tradicional. Dentre tantas histórias contadas de forma engraçada e com profundidade, tive a oportunidade de conhecer um professor que ensina de forma não linear. Pra mim um alívio, já desde cedo avessa às regras desse mundo antigo em que me encontro.
De forma dinâmica e divertida o professor nos convida, a cada aula, a um pensar diferente, bem mais amplo, através de seus gestos naturais e frases que nos promovem o riso intenso e que proporciona aquele alívio necessário ao corpo e à alma por estar ali, estudando até às 11 da noite. Estudando? É necessário lembrar que se trata de um estudo, porque mais do que um aprendizado, estar ali tem sido uma lição de vida.
Eu parabenizaria o professor se achasse que suas aulas são espetaculares. E até acho mesmo que são. Mas elas são apenas consequência do ser que ele é: intenso, leal consigo mesmo, sendo um ser tão único, transparente, ousado, atrevido e corajoso. Suas aulas são apenas um reflexo daquilo que ele é.
E se ele é mesmo de Marte, é pra lá que eu vou. E eu sei que eu não vou sozinha…