_ “As pessoas têm que ser boazinhas! ”, ouvi certa vez e fiquei encafifada.
De que maneira podemos ser bonzinhos o tempo todo, num mundo, que “de vez em muito”, se mostra cão?
Somos capazes de ser bons, gentis e amáveis, quando os outros também o são, quando nos apreciam, reconhecem nossos esforços e pontos positivos. Mas o que ocorre se estamos prestes a perder um marido, um emprego, se somos traídos por um amor ou uma amizade que se acreditava ser verdadeira? Como reagimos se somos maltratados por um filho ou um irmão? Como agimos no dia-a-dia se somos submetidos a condições de trabalho ou de alguma atividade diária, pior do que acreditamos merecer? Então, nessas condições, podemos saber quem somos.
Já diziam as avós: “Quer conhecer uma pessoa de verdade? Veja como ela se comporta em casa, num jogo de futebol ou numa discussão política! ”.
São nos momentos de tensão, dificuldade e contrariedade que se conhece alguém em sua essência. E mais importante do que conhecer o outro, em condições de máxima pressão, é conhecer a si mesmo.
Passei por diversas situações de contrariedades em minha vida. E sei que por inúmeras vezes reagi com reclamações, agressividade, negação e imaturidade. Agora, apesar de ainda não gostar de dificuldades e situações extremas, aprendi a apreciar esses momentos, por perceber em mim uma calma à altura dos problemas que chegam. Reação sem agressividade ou reclamação, e sim aceitação. Árdua resiliência. Silêncio no lugar das queixas. E senso de responsabilidade no lugar de vitimização.
O calar-se em situações extremas me permite avaliar o que eu sinto no momento de vulnerabilidade. As profundas reflexões sobre o instante, sua causa e possíveis consequências, além dos envolvidos, me permite uma compreensão maior do ocorrido e de melhores chances de passar bem pela fase difícil.
Já vi um grupo inteiro de pessoas mostrar comportamento negativo e diferente do inicial, devido a uma mudança em suas vidas, consideradas como contrariedades. Pessoas que eram amáveis se tornarem críticas e desagradáveis, por reação negativa e de não aceitação em grupo. A reclamação e negatividade são absolutamente contagiosas. Se é difícil reagir bem sozinho, mais ainda se em meio a pessoas que reagem imediatamente com reclamações e negatividade.
E como também já diziam as sábias avós, um problema nunca costuma vir sozinho. Por vezes vem dois, três ou muitos…
Recentemente, tive a oportunidade de experimentar várias situações inusitadas e à primeira vista negativas em minha vida: a perda temporária de meu lar e todos os meus pertences, devido a interdição do prédio onde eu morava. Vulnerabilidade de diversas formas chegaram em minha vida.
Talvez pudesse ter chorado as decepções que inevitavelmente aconteceram.
Confesso que não foi uma semana agradável, mas ao mesmo tempo, foi incrível reconhecer a maturidade adquirida, através do silêncio e conquistada aceitação. Atitudes cabíveis a medida que se podiam ser tomadas, sem reclamações.
Não foi do dia para noite que alcancei este nível de reação, mas através de dores que quase ninguém sabe, tapas que ninguém viu e decepções profundas que não tiveram suas testemunhas. E muito ainda pode ser melhorado, se persisto neste caminho.
Para saber quem somos de verdade, é necessário uma auto avaliação nesse tipo de momento, de mais puro dessabor, desavença e contrariedade. E ser bom numa situação assim é uma grande conquista e realização. A satisfação de se ter alcançado uma versão melhor de si mesmo.
Quando formos capazes de sermos bons dentro de casa, numa discussão política e num jogo de futebol, então saberemos que finalmente nos tornamos bons.
Antes de afirmar que as pessoas devem ser boazinhas, devo eu estar apto a ser bom, nos piores momentos de minha vida.