Em que momento nos tornamos mães de verdade? Não falo da gravidez ou do fato de gerar uma criança, mas da abdicação de si mesma pelo amor daquele ou daquela, que se torna mais importante que tudo. Tenho para mim, que este processo ocorre em diferentes momentos para cada mulher. E inúmeras vezes. Se no decorrer da vida somos várias versões de nós mesmas, também o somos como mães.
Tenho uma amiga que temia ser mãe. Não pelas razões que hoje são bastante faladas, como a liberdade, independência e o simples não querer, mas ela tinha uma história em sua ancestralidade, que colocava a maternidade como algo negativo para as mulheres de seu sistema familiar.
Alguns anos de terapia foram necessários, para que minha amiga encarasse a maternidade em sua vida. Eu mesma, na época, me questionava sobre como ela se sairia sendo mãe, tendo ouvido a maior parte de sua vida, de que aquela decisão não seria acertada e nem feliz.
Anos depois, tive a oportunidade de passar algumas noites na casa desta amiga com seus dois filhos pequenos. E para a minha mais absoluta e positiva surpresa, vi que ela não apenas tinha quebrado o padrão de sua ancestralidade, como havia se tornado, provavelmente, uma das mães mais amorosas e atenciosas que já conheci.
Num ritual diário, longo e até mesmo cansativo, considerando a correria da maioria das pessoas, minha amiga, primeiramente, lê uma história para seus filhos, na hora de dormir. Em seguida, pergunta para cada um deles sobre três coisas que aconteceram em seu dia, pelas quais se sentem gratos. Ela anota num caderno e então eles fazem a oração do “Pai Nosso” juntos. Cada um agradece a Deus pelo seu dia e ainda fazem meditação, com foco na respiração. Por último, eles escolhem uma música e ela canta para eles. A mãe beija e abraça cada um deles e se retira do quarto.
Creio que o ritual elaborado pela minha amiga dura cerca de uma hora, mais ou menos. Tive o privilégio de participar do mesmo por três vezes. Não foi apenas o ritual em si que me agradou profundamente, mas ver a transformação que minha amiga tinha alcançado em sua vida. Sua transformação interna e ressignificação mudaram não apenas sua própria vida, mas deu significado às vidas de seus filhos e mais: ela teve a capacidade de mudar o padrão que vinha de gerações, criando relações difíceis para as mães e seus filhos, de parte de sua família.
Muitos de nós temos padrões negativos em nossos sistemas familiares e passamos a vida repetindo o que nossos pais e avós fizeram, sem a plena consciência do fato. Deixamos de ser pessoas melhores e vivemos uma vida menos digna, pela ignorância de tais repetições. Quebrar um padrão que é negativo não é apenas libertador para si mesmo, mas para uma família toda e suas próximas gerações.
Para minha amiga, este processo durou anos. Ela realmente denotou esforço, tempo e apoio profissional, para ter a coragem de enfrentar o seu maior medo e ter resultados diferentes. E teve!
Não posso afirmar em que momento minha amiga se descobriu a mãe que é hoje, mas sua profunda mudança é uma das histórias de amor mais lindas que pude testemunhar: sua transformação pela e através da maternidade.
Um amor incondicional pelos filhos, que será sentida por todas as mulheres de suas próximas gerações, não mais carregando um peso de ser mãe, mas uma dádiva!