Não apenas a arte se divide em comédia e tragédia, mas há os que percebem a vida assim, como uma coisa ou outra.
Certo que, se na prática a vida fosse mesmo uma escolha, muitos optariam por viver apenas na comédia, já que rir alivia a alma. Porém, o que seria da vida se vivêssemos apenas nas gargalhadas? Como seria a nossa evolução e crescimento, se apenas experimentássemos os risos e piadas, por vezes, cheias de deboche e nenhuma profundidade de sentimento e reflexão?
A comédia é tão necessária em nossa vida quanto a tragédia. Precisamos das válvulas de escape para fugir da dor, do sofrimento, do dia-a-dia corrido e da própria solidão e revolta que criamos em diferentes fases da vida.
Já a tragédia representa tudo aquilo que não queremos e fugimos dela a qualquer custo. A dor, a decepção, a morte, traição, medo. Será que faz sentido uma vida sem tragédia?
Uma simples reflexão pode nos levar a compreender que nenhuma vida se faz sem tragédia alguma. Independentemente de quem se seja, classe social, raça ou credo, todos perderão alguém um dia, e também morrerão. Não se sabe de onde viemos e nem para aonde vamos. Vivemos uma vida cheia de perguntas e quase sem respostas. Adquire-se um mínimo de conhecimento e sabedoria, quando já é tarde demais. À medida que se envelhece, a caminho da morte, mais se compreende o sentido da vida. E faz sentido? Nascer, crescer, morrer e partir sem a certeza do que virá em seguida?
Se seguirmos sem cessar na lógica filosófica, gerando sempre novos questionamentos, certo que enlouqueceremos em algum ponto do caminho.
A vida na prática vem a ser uma mistura de tragédia e comédia. Ora estamos felizes, ora estamos tristes. Ora estamos sozinhos, ora acompanhados, bem ou mal. Ora estamos satisfeitos, ou insatisfeitos. Numa roda viva incessante, num sobe e desce que não para nunca, aprendemos na marra o equilíbrio entre o rir e o chorar. Acordamos para o dia, sem nunca ter a certeza absoluta, de que não iremos morrer nessas mesmas vinte e quatro horas. Ignoramos a nossa fragilidade e ignorância, para sobrevivermos a incerteza de tudo, mas principalmente da morte iminente.
A meu ver, a maioria de nós conta suas histórias através das marcas que tem: o dia em que nasceram, seus relacionamentos, grandes feitos, mas mais importante ainda, as grandes perdas. Nossas cicatrizes contam mais sobre o que somos, do que nossas rugas ou documento de identidade. As dores pelas quais passamos, é o que nos força a seguir em frente, o que nos fortalece, nos ensina, nos molda a intensidade do caráter e da personalidade. E por isso a tragédia nos marca mais do que a comédia, pois é ela quem traz o sentido da vida, com todas as suas dores.
Se vivêssemos somente na superficialidade dos risos, não teríamos motivos para pensar, buscar o autoconhecimento, a sabedoria da vida. A tragédia nos permite o conhecimento que não torna a nossa vida e nem a nós mesmos numa simples comédia cheia de deboches.
A vida não pode ser só uma coisa ou outra. E a boa tragédia nos livra da comédia que ridiculariza o outro e também nos diminui como seres humanos. A dor nos abre os olhos e o coração para ver o próximo a partir da tragédia de nossas próprias histórias. O sofrimento que cada um carrega nos ensina a hora certa do riso, bem como a hora certa de cessar o choro.
Viver é um eterno equilíbrio entre rir e chorar. E quanto mais tempo passa, mais compreendemos que ambos são apenas parte de uma coisa só: da vida, simplesmente como ela se faz.